Para entender bem
os efeitos diuréticos do álcool no organismo humano, é necessário antes
compreender a ação de um hormônio muito importante na regulação da pressão
arterial chamado de vasopressina ou ADH[1]
(sigla, em inglês, para hormônio antidiurético).
A água consegue
permear as células epiteliais que
revestem os ductos coletores renais graças a um tipo de aquaporina[2]
(AQP-2) presente em suas membranas citoplasmáticas apicais (direcionadas para o
lúmen do ducto). A vasopressina regula a retenção de água, ao mobilizar
vesículas membranosas no interior das células epiteliais e que possuem em sua
membrana as aquaporinas; as vesículas se fundem à membrana celular e, assim ,
expõe os “transportadores de água”. Isso faz a permeabilidade à agua aumentar,
permitindo com que ela seja reabsorvida pelo ducto, voltando para o sangue[3],
o que diminui o volume da urina. Em menores concentrações de ADH, a AQP-2 é
ressequestrada para as vesículas, diminuindo a reabsorção de água[4]
no processo de formação de urina.
O álcool (etanol),
presente em diversas bebidas fermentadas e destiladas, é um potente inibidor da
síntese de ADH. Assim, há um aumento na diurese, devido a uma menor reabsorção
de água nos rins. Isso gera um quadro clínico conhecido como diabetes insípido[5],
na qual são excretadas grandes quantidades de líquido, provocando sede extrema
no portador (sintoma da desidratação).
Desse modo, o
indivíduo afetado por essa situação fisiológica tende a ingerir grande volume
de líquido, o que maximiza a poliúria característica, gerando também polidipsia[6],
sem incorrer, contudo, em alteração da osmolaridade sanguínea ou da
concentração anormal de íons. Se, porém, o paciente não tiver disponibilidade
de água, o quadro evoluirá para uma desidratação severa e hipernatremia[7].
Também relacionado
a esse assunto está um fármaco conhecido como furosemida. Ele atua
especificamente na alça de Henle (uma estrutura do néfron – a subunidade
funcional do rim) e tem propriedades diuréticas e natriuréticas (ou seja,
aumenta o volume de urina e a quantidade de sódio excretada). (Na figura abaixo, uma representação da estrutura química da furosemida.)
O modo de atuação
da furosemida – semelhante aos de outros medicamentos diuréticos que atuam na
alça néfrica – se baseia na inibição do transportador Na-K-2Cl, principalmente,
na estrutura em questão, mas também minoritariamente nos túbulos contornados
proximal e distal. Isso restringe a reabsorção dos íons Na+ e Cl-,
gerando uma redução na osmolaridade do sangue que está sendo filtrado, de modo
que a água é impelida para os túbulos.
Assim, o volume de
urina fica maior, o de sangue, menor e a pressão sanguínea é reduzida. Por
isso, a furosemida é indicada para tratar casos de deficiências hepáticas,
cardíacas ou renais que tenham desencadeado um edema[8]
em alguma região do organismo, além de casos de hipertensão.
Fonte:
http://en.wikipedia.org/wiki/Diabetes_insipidus
https://en.wikipedia.org/wiki/Vasopressin
https://en.wikipedia.org/wiki/Vasopressin
Nelson,
David L. Cox, Michael M. Princípios de Bioquímica de Lehninger. Porto Alegre:
Artmed, 2011
Dicionário Houaiss
da língua portuguesa, Editora Objetiva. Rio de Janeiro, 1a edição, 2001.
[1] O ADH é produzido pelo
hipotálamo e secretado pela neurohipófise. Ele é liberado na corrente sanguínea
quando há uma queda na pressão arterial ou ocorre desidratação. Nos dois
casos, a ação do hormônio se contrapõe
ao estímulo à sua produção.
* A vasopressina é um peptídeo formado por nove resíduos de aminoácidos em forma de anel, devido à uma ligação bissulfeto entre dois resíduos de cisteína nas posições 1 e 6.
[2] Aquaporinas são canais
(geralmente, proteicos) transmembrânicos que possuem em seu interior uma
superfície hidrofílica, permitindo o transporte de espécies polares, íons e
água.
[3] Com um maior volume sanguíneo, a pressão arterial aumenta. Daí, uma
das importâncias do ADH para o controle dessa variável fisiológica. Outra
atuação sua é gerar uma vasoconstrição moderada nas arteríolas do organismo,
fator que também contribui para o aumento da pressão arterial.
[4] Por isso, o ADH também é conhecido como hormônio poupador de água.
[5] O termo diabetes vem da
grande quantidade de urina eliminada e insípido,
da ausência de gosto, uma vez que os compostos estão extremamente diluídos e
não há excreção de glicose (ao contrário do diabetes melito). A ingestão de
álcool, porém, não é a única causa dessa enfermidade, a qual também pode ser
gerada por deficiências inatas na produção desse hormônio (por defeitos genéticos)
ou problemas em receptores para o hormônio.
[6] Polidipsia é uma sede
excessiva causada por diabetes.
[7] Hipernatremia é um excess de sódio no sangue, indicativo de
desidratação.
[8] Edema é um acúmulo
anormal de liquido em tecidos, principalmente no tecido conjuntivo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário