Apesar do tema central deste blog ser a hipertensão, vai-se falar nesta postagem sobre um tema diferente: o sistema imune. Para isso, cabe-nos levar em conta que o óxido nítrico desempenha nesse um papel fundamental. Sabe-se que ele é responsável por, junto com seus derivados, matar micróbios, sendo um mediador na defesa de um organismo infectado, e células tumorais.
Para se entender a ação do óxido nítrico no sistema imunológico, é preciso antes esclarecer um fato. Existem duas formas da NO-sintase (a enzima responsável pela produção do óxido a partir do aminoácido arginina). A primeira é chamada de constitutiva (c-NOS) e está envolvida na sinalização celular (por cGMP, muitas vezes induzindo vasodilatação). É dependente de íons cálcio e calmodulina, encontrando-se principalmente em células endoteliais vasculares (NOS endotelial, e-NOS) e neurônios (NOS neuronal, n-NOS). Sua produção de óxido nítrico é geralmente bem pequena (da ordem de nano ou picomols).
A outra isoforma chamada de NOS induzível (i-NOS) não é expressa (por síntese proteica/tradução de mRNA) em condições usuais (e, quando expressa, requer algumas horas para ser produzida), tendo sua produção induzida por citocinas[1] e endotoxinas[2] em várias células (como macrófagos, linfócitos T, neutrófilos e até as próprias células endoteliais). É capaz de sintetizar grandes quantidades de óxido nítrico de maneira ininterrupta até que se esgotem o substrato ou cofatores para sua síntese ou haja morte celular.
O óxido nítrico produzido desta última maneira é capaz de “atacar“ quimicamente e destruir microrganismos parasitas e células cancerígenas. Essas propriedades citotóxicas do óxido nítrico derivam de sua ação direta ou da ação de produtos resultantes deste com outros compostos liberados em processos inflamatórios.
Sua ação indireta ocorre sobretudo em decorrência de infecções. Nesses casos, algumas células[3] secretam o óxido e substâncias intermediárias e extremamente reativas derivadas do oxigênio. O NO reage com essas substâncias, gerando compostos citotóxicos. Um exemplo de reação é com o ânion superóxido (O2-), formando peroxinitrito (ONOO-), o qual tem grande poder de oxidar proteínas. O peroxinitrito pode ainda reagir com íons H+, formando ONOOH, o qual se decompõe em OH e dióxido de nitrogênio (NO2)[4]. O radical hidroxil (OH), por ser um radical livre[5], é extremamente tóxico e reativo, potencializando a toxidade do óxido nítrico e do superóxido.
Já sua ação direta se baseia em sua reação com o metais (principalmente o ferro) em proteínas e enzimas alvo. Assim, consegue inativar complexos proteicos essenciais para a síntese de DNA, para a Cadeia Transportadora de Elétrons, para o ciclo de Krebs e a multiplicação celular (mitose)[6]. Isso só é possível devido ao fato de o próprio óxido nítrico ser um radical livre e, assim, poder reagir facilmente com biomoléculas.
Contudo, vale ressaltar que a célula que produz o óxido nítrico com essas finalidades, bem como suas vizinhas, não estão imunes às propriedades citotóxicas do óxido nítrico, podendo ser danificadas e até destruídas.[7]
Apesar de o uso do óxido nítrico como agente de defesa do sistema imune não ser algo exclusivo de um único grupo celular, essa função é preferencialmente exercida por certos tipos de leucócitos. Essas células – também conhecidas como glóbulos brancos – são componentes dos elementos figurados do sangue, sendo responsáveis pela defesa do organismo contra agentes patogênicos.
Dentro os vários tipos de leucócitos, estão os granulócitos, os quais possuem vários lisossomos[8] e vesículas secretoras (ou grânulos, daí seu nome). Entre os granulócitos, destacam-se ainda os neutrófilos (o tipo mais comum de granulócito), responsáveis pela fagocitose de parasitas unicelulares e microrganismos (principalmente, as bactérias), ou seja, são responsáveis por englobar e digerir organismos ou partículas estranhas. O citoplasma dessas células contém um tipo especial de grânulos: os do tipo azurófilos. Essas estruturas celulares são uma das principais responsáveis por produzir radicais livres e compostos oxidantes a partir do óxido nítrico, sendo as primeiras células a chegar a um local acometido por inflamação. Assim, são responsáveis diretamente por impedir que uma infecção e, caso a infecção já tenha ocorrido, minimizam sua generalização para o organismo. Abaixo, segue uma foto de um neutrófilo com seus grânulos azurófilos (em destaque, de cor púrpura):
Fontes:
http://books.google.com.br/books?id=S-wTcL09ROAC&pg=PA75&lpg=PA75&dq=grânulos+azurófilos+radicais+livres+óxido+n%C3%ADtrico&source=bl&ots=vKcjCjqvpR&sig=y9LPQVwOJS0M9FJl_daVl0q3Gag&hl=pt&sa=X&ei=Rlq4UdjPH5Ly9gS01oHQAw&ved=0CCkQ6AEwAA#v=onepage&q=grânulos%20azurófilos%20radicais%20livres%20óxido%20n%C3%ADtrico&f=false
http://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=3&ved=0CDIQFjAC&url=http%3A%2F%2Fwww.revistas.ufg.br%2Findex.php%2FREF%2Farticle%2Fdownload%2F3026%2F3048&ei=Rlq4UdjPH5Ly9gS01oHQAw&usg=AFQjCNGtmPrkTgP8PjlMVT56_6ljXtVHMw&sig2=63L8JVQft6LXA9gt-5tiAg&bvm=bv.47810305,d.eWU
http://www.drashirleydecampos.com.br/noticias/15980
http://www.oocities.org/veterinariobr/materias/hematologia/leucocitos.htm
http://pt.wikipedia.org/wiki/Endotoxin
http://www.infoescola.com/citologia/neutrofilos/
Alberts, Bruce. Biologia Molecular da Célula;
tradução Ana Letícia de Souza Vanz. 5a edição. Porto Alegre: Artmed, 2010.
[1] Citocinas são proteínas
ou peptídeos que mediam a comunicação intercelular, atuando como sinalizadores
extracelulares.
[2] Endotoxinas são toxinas
da parede celular bacteriana que só são liberadas no meio após a destruição
dessa estrutura.
[3] Macrófagos, neutrófilos e células endoteliais.
[4] Além dessas substâncias tóxicas, podem ser geradas várias outras
como NO-2, N2O3 e NO3.
[5] Radical livre é qualquer
espécie química (geralmente, átomo ou molécula) que, apresentando pelo menos um
elétron desemparelhado, é extremamente reativo. Nas células, é responsável por
gerar danos aos ácidos nucleicos (DNA e RNA) e desencadear processos tumorais.
[6] Dois dos processos descritos anteriormente são essenciais para a
manutenção da vida celular, uma vez que dizem respeito à produção de energia
para a célula (ciclo de Krebs e cadeia
transportadora de elétrons). Desse modo, isso pode causar morte celular de
parasitas ou células tumorais. Já a inibição da síntese de DNA e da divisão
celular são processos associados diretamente ao combate às células tumorais
(aquelas que se dividem de modo incontrolado), mas também pode evitar a propagação
de um microrganismo parasitário no hospedeiro.
[7] Já se associou o excesso de
óxido nítrico a vários processos patológicos como asma, lesões
ateroscleróticas, gastrite induzida por Helicobacter
pylori, esclerose múltipla, artrite reumatoide, dentre outras.
[8] Lisossomos são vesículas
membranosas produzidas pelo aparelho de Golgi e que abrigam internamente
enzimas digestivas.
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